08 outubro, 2008

Rabos-de-palha; todos temos

Passamos a vida a queixar-nos disto e daquilo. Mas depois; depois por comodidade ou cobardia, não tiramos as asas do armário. Há quem se dedique a pedir licença para existir. Uma espécie de liberdade acorrentada a palermices. O culto do medo de ter coragem.
Talvez tudo comece no gosto de mastigar azedas na infância. Que depois se prolonga no exercício de mudar prioridades. A fome cansada que se estende no sofá-da-lei-do-menor-esforço. A bebericar um chá de tenham-piedade-de-nós.
Na vida de casal os carros já são entregues com os maridos ao volante. Ainda há quem defenda que as meninas quando nascem, já deviam trazer um trem-de-cozinha. Nos restaurantes e bares, ao lado dos dísticos de proibido fumar, devia ser obrigatório a afixação de outros, com os dizeres; o homem é que paga a conta.
O melhor mesmo é esperar. Não acham? Embora não gostemos de esperar seja lá por quem for. Esperamos sempre que tudo o que desejamos aconteça; por obra e graça do Divino Espírito Santo. Espera-se o milagre que dissipe o nevoeiro do presente, e nos presenteie com um sol radioso no futuro.
Há a “ingenuidade” preguiçosa de acreditar; que a mudança de governo nos traga melhores dias. A realidade não se compadece com o desejo de chegar sem ter de ir. Lembram-se do “sonho americano”? Pois é; agora virou pesadelo para o mundo inteiro. Será que ainda acham que os sonhos não têm de ser construídos?
Podemos até encetar a existência de aranha, e esperar que tudo nos venha cair na teia. Ainda assim; convém não esquecer da necessidade de construir a teia. A rendição ao deslumbre pelo que fizemos ontem, significa que estamos a desperdiçar o precioso tempo, destinado à tarefa a executar no dia de hoje.

Rabos-de-palha; todos temos.

4 comentários:

kurika disse...

Bom...aquela da entrega dos carros com marido ao volante é fantástica!!!
Onde é esse stand?

Tudo verdade.

Bjinho

impulsos disse...

Este texto deveria ser lido por uns que eu cá sei...
Há muita gente que passa a vida a lamentar-se e faz disso uma forma de estar na vida.
Não sei muito bem o que esperam construir(ou destruir) com isso, mas que lhes está no sangue como um veneno, lá isso está.
Acho que se arregaçassem as mangas e metessem mãos à obra em vez de enfadarem os outros com as suas desgraças, talvez fizessem melhor figura.

É sempre com prazer que leio o que tão bem sabes escrever, para mim, és um verdadeiro mestre da escrita!

Beijo

Vanda Paz disse...

Todos os dias me consegues supreender. Lembro-me de mastigar azedas quando era pequena, agora tenho de mastigar todos os dias pessoas inuteis. A sorte é que nem tudo se pega.

Beijo

Ana disse...

Essa do "homem é que paga a conta" é demais!
Cá para mim, é sempre "contas à moda do Porto".

Mas tens muita razão, sobretudo em sublinhar que ao olhar para ontem estamos a perder o hoje.

E cada hoje tem sempre um valor imperdível, irrepetível.